05/03/13

Escrita Automática X


Era uma vez um país
que tinha um teatro nacional
nesse teatro decidiu o seu encenador
fazer qualquer coisa como Condomínio de Rua
Peça essa cujo texto aborda as temáticas da pobreza e da exclusão
O preço de entrada, ou o ingresso se quisermos simplificar
Era nada mais, nada menos do que… Alimentos
E o slogan era algo não pouco pomposo
como TEATRO POR ALIMENTOS
Projecto esse resultante entre esse tal teatro
e uma instituição de caridade social
Juntando assim o útil ao agradável
o espectador fica contente porque pagou uma lata de atum
(não de salmão fumado, não vem na listagem dos alimentos mais solicitados da instituição) para ir ao teatro (e ao nacional!)
E os artistas (?) ficam contentes porque tiveram público
(não sei se tiveram, não fui. Não troco alimentos por teatro)
E a sociedade em geral – a dita civil – fica contente também
Cumpre-se assim o dever de se ajudar o próximo

Apraz-me dizer:

Ai é tão bom
Sermos pró-activos
Ai é tão
termos consciência social
Ai é tão bom
Sermos apolíticos
Ai é tãotºos
cialnsci bom
A caridadezinha
Num país qualquer
Em que se dá alimentos por teatro

Teatro por alimentos
Vale agora um bilhete

Dignidade por alimentos
Trabalho por alimentos
Saúde por alimentos
Educação, habitação,
Tudo o que é um direito em troca de alimentos

Mas espera lá, de uma lata de atum ou um pacote de salmão fumado?!

Opá, não sei,
teria de mergulhar no “submundo do ser humano”,
nos seus “segredos e dilemas”,
ah, estava-me a esquecer da “questão de falta de afecto e as suas consequências”
para poder compreender melhor os motivos e as soluções de tal flagelo social.

Enquanto isso, vou preparando o fato de mergulho e as barbatanas para quando tiver que mergulhar no submundo. Até lá peço aos meus amigos que me deem muito amor e carinho e que me ajudem a descobrir os meus segredos e dilemas, quando daqui a breves instantes tiver de andar a mendigar - estou a brincar (mendigar seria para esse tal encenador desse tal teatro nacional de um país qualquer) – digo: quando estiver no desemprego, sem rendimento para pagar a renda da casa, e os ALIMENTOS! A ser despejada e sem quaisquer perspectivas de uma vida digna.

Enquanto isso não acontece pago um terço do meu ordenado por uma cirurgia numa clínica privada cuja especialidade - vai-se lá saber porquê - não existe no SNS. (Esqueci-me de perguntar ao dentista se aceitava pacotes de leite e bolachas Maria a prestações).

Bárbara Bardas

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