Era uma vez um país
que tinha um teatro nacional
nesse teatro decidiu o seu encenador
fazer qualquer coisa como Condomínio
de Rua
Peça essa cujo texto aborda as temáticas da pobreza e da exclusão
O preço de entrada, ou o ingresso se quisermos simplificar
Era nada mais, nada menos do que… Alimentos
E o slogan era algo não pouco pomposo
como TEATRO POR ALIMENTOS
Projecto esse resultante entre esse tal teatro
e uma instituição de caridade social
Juntando assim o útil ao agradável
o espectador fica contente porque pagou uma lata de atum
(não de salmão fumado, não vem na
listagem dos alimentos mais solicitados da instituição) para ir ao teatro (e ao nacional!)
E os artistas (?) ficam contentes porque tiveram público
(não sei se tiveram, não fui. Não troco alimentos por teatro)
E a sociedade em geral – a dita civil – fica contente também
Cumpre-se assim o dever de se ajudar o próximo
Apraz-me dizer:
Ai é tão bom
Sermos pró-activos
Ai é tão
termos consciência social
Ai é tão bom
Sermos apolíticos
Ai é tão
A caridadezinha
Num país qualquer
Em que se dá alimentos por teatro
Teatro por alimentos
Vale agora um bilhete
Dignidade por alimentos
Trabalho por alimentos
Trabalho por alimentos
Saúde por alimentos
Educação, habitação,
Tudo o que é um direito em troca de alimentos
Mas espera lá, de uma lata de atum ou um pacote de salmão fumado?!
Opá, não sei,
teria de mergulhar no “submundo do ser humano”,
nos seus “segredos e dilemas”,
ah, estava-me a esquecer da “questão de falta de afecto e as suas
consequências”
para poder compreender melhor os motivos e as soluções de tal flagelo
social.
Enquanto isso, vou preparando o fato de mergulho e as barbatanas para
quando tiver que mergulhar no submundo. Até lá peço aos meus amigos que me deem
muito amor e carinho e que me ajudem a descobrir os meus segredos e dilemas, quando
daqui a breves instantes tiver de andar a mendigar - estou a brincar (mendigar
seria para esse tal encenador desse tal teatro nacional de um país qualquer) – digo:
quando estiver no desemprego, sem rendimento para pagar a renda da casa, e os ALIMENTOS!
A ser despejada e sem quaisquer perspectivas de uma vida digna.
Enquanto isso não acontece pago um terço do meu ordenado por uma cirurgia
numa clínica privada cuja especialidade - vai-se lá saber porquê - não existe
no SNS. (Esqueci-me de perguntar ao dentista se aceitava pacotes de leite e
bolachas Maria a prestações).
Bárbara Bardas
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