Ana Luísa Amaral
19/03/16
13/03/16
REVOLUÇÃO E MULHERES DE NOVO (uma re-leitura da Maria Velho da Costa)
1.
RECONSTITUIÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO
Elas
são cinco milhões, o dia nasce, elas abrem os estores. Elas cortam
o pão e fazem café. Elas escrevem a divisão de tarefas para o
resto da semana. Elas picam cebolas e descascam batatas. Elas fazem
panelas de sopa que congelam em pequenas caixas de plástico para
vários dias. Elas chamam ainda escuro os homens e os animais e as
crianças. Elas enchem lancheiras e pastas de escola. Elas fazem três
máquinas com os lençóis e as camisas que hão-de sujar-se outra
vez. Elas aspiram o chão e correm com os insectos para que não
venham adoecer os seus enquanto dormem. Elas fazem contas complicadas
para saber onde são os supermercados mais baratos. Elas contam
cêntimos. Elas criam páginas de facebook onde vendem os velhos
cachecóis de malha que a avó lhes ensinou a fazer. Elas trocam
tutoriais sobre comida japonesa. Elas fazem limpezas em cinco casas
diferentes e mais dois escritórios. Elas sairam de casa às 4 da
manhã. Elas correm esbaforidas para não perder o comboio, o
autocarro e o barco. Elas já contam hoje 17 horas de trabalho. Elas
pousam o casaco nas costas da amiga e trocam saudades em crioulo de
países mais quentes. Elas têm habilitações a mais para trabalhar
naquela loja. Elas não fizeram o nono ano porque na altura a mãe
precisava que elas fossem trabalhar. Elas pousam os sacos das compras
e abrem a porta com a mão vermelha. Elas acendem o lume. Elas mexem
o arroz com um garfo. Elas enchem os pratos. Elas pousam o alguidar
na borda da pia para aguentar. Elas arredam a coberta da cama. Elas
também dormem.
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