27/07/12

RIP Carlos Alberto Bernardo Fernandes

Ficha de Identificação:

Engraxate de profissão
Utente do Júlio de Matos
Filho de uma peixeira
Bastardo de um coxo (vendedor da sorte grande)

Não fosse eu ter fugido à tropa
E se para a Suíça não tivesse ido
Elisabete não teria conhecido

Não fosse Lisboa uma prisão
E eu e a minha minhoca
À praia não teríamos ido

(Minhoca era menina
Minhoca era introspetiva
Minhoca ia às cavalitas
Minhoca morava perto do mar)

Não fosse a solidão um grande presente
E eu a morte não teria conhecido,
À terra não voltaria

Não fosse a miséria tão matemática
E eu não me teria ido,
O meu corpo não teria dado

Não fosse a indiferença tão sagaz
E eu – feito Papillon – não me teria deliberadamente
Libertado da vida. Borrado e enforcado naquele quarto.

Se não o tivesse feito
Não teria escolhido a nona capicua: 09.09.09

(Se morrer não tivesse morrido
À terra mais minhocas não daria.
A imagem do meu corpo arroxeado,
Gelado e a minha boca entreaberta
Com os meus dentes de mentiroso
Não teria oferecido)

Bárbara Bardas – Poemas da Crueldade

2 comentários:

  1. cruel a realidade, claro o poema

    um pontapé no conforto do esquecimento

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  2. lembrar é marcar.
    lembrar é não esquecer.
    lembrar é rebuscar.
    não há conforto do esquecimento. nem mesmo para quem não esquece.

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